sexta-feira, 28 de maio de 2010

São João


(Se beber, não dirija)

Por que razão uma quadrilha vestindo rosa-choque e uma bandinha com cara de fome batucam e dançam para uma câmera da Globonews, às sete horas da manhã? – Para ilustrar matéria sobre a abertura oficial das festas juninas em Caruaru-PE, com aquele texto-padrão que deveria exalar euforia, como recomendava a Leilane Neubarth, em seus media training: “Vai ter isso e aquilo, prêmios, diversão para toda a família, talvez o próprio São João reencarnado gritando: - Olha a cobra! –É mentira”.

Mas o texto que acompanha as imagens é um amontoado de mesmices burocraticamente expelidas sem nenhum entusiasmo. Reflexo do que se transformaram as próprias festas juninas no Nordeste, atacadas sem piedade pela indústria de bebidas, nos últimos anos como, aliás, a maioria das outras comemorações populares do país.

E por que as emissoras de TV cumprem, sem questionar, esse ritual, ano após ano? – Primeiro, porque os fabricantes de bebidas estão entre os seus maiores anunciantes, claro. Depois, porque a falsa alegria evita que as pessoas pensem na descaracterização de seus costumes, na educação precária, na violência e nas drogas, na poluição, nos descaminhos das religiões, nas desigualdades e em todas essas outras chatices que não enchem barriga. Nem os olhos.

Mas as novas festas juninas, se é que cabe a classificação, também interessam ao comércio, à indústria do turismo e, em ano eleitoral, àquela politiquinha de cabresto que sempre dá um jeito de aparecer nos eventos populares, nem que seja para sair numa fotinho, ao lado de um famoso, numa Caras local.

O texto da notícia de hoje (28/5), na Globonews, não deixou de informar a presença de nossos grandes artistas em Pernambuco. Todos devidamente patrocinados pelas marcas de bebidas e de cartões de crédito, também presentes nos outros carnavais. E, mais uma vez, milhares de pessoas vão lotar as praças e avenidas com a sua boa vontade, barulho, lixo e embriaguez, para realimentar a sua própria frustração, até o próximo ano, quando as lembranças já se terão esvaído, deixando um gostinho de saudade.

Pois é. A minha saudade é outra, mas não me envergonho dela. Independentemente da colheita, do solstício e das bruxas do norte, que não voltam mais, continuo preferindo o pé-de-moleque e a batata doce da fogueira, o som da sanfona caipira e, principalmente, o quentão de pinga e gengibre, em vez de Cuba Libre e Capeta.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Dunga, Mestre e Zangado



Não conheço os detalhes – não sou religioso, nem no futebol – mas agradeci aos deuses o relativo silêncio das emissoras (principalmente), sites e jornais (relativamente) em torno da seleção brasileira, neste fim de semana. Com o perdão dos amigos fanáticos – dois deles, seguidores deste blog, para minha honra e gáudio – estou na contramão da contagem da Globo: por mim, a Copa começaria às 11 horas do dia 11 de junho, a contar do apito inicial de México x África do Sul, em Johannesburgo.

Achei engraçada, a matéria da Sports Ilustrated (O samba está morto), associando a rigidez do nosso treinador ao novo perfil sócioeconômico do país (eu, se pudesse, iria à Brodway uma vez por ano); percebo as necessidades da mídia-negócio e entendo a afirmação do comentarista Edmundo (que se tornou conhecido como o Animal, enquanto jogador), ao rechaçar o mito de que a seleção entregou o jogo à França em troca de sediar o mundial de 2010: “O Brasil não tem educação nem cultura, só o futebol - por isso, somos obrigados a conviver com essas coisas”. Eu não iria tão longe.

No entanto, gostei da trava imposta pelo Dunga ao treino da seleção brasileira (OG, 22/05) porque, afinal, foram menos 48 horas de Mesa Redonda, Futebol Debate, em todos os canais de informação do país. Imaginem se a Veja resolvesse repercutir o fato, entrevistando a Sabrina Sato, do Pânico, em suas páginas amarelas, Ou se a Marília Gabriela tivesse que inquirir o Augusto Nunes e o Paulinho Moreira Leite sobre a ausência de meias na seleção, ontem (23/05) no GNT. O Augusto batia uma bolinha de vez em quando, mas o Paulinho acharia que os chineses estão boicotando a entrega de material esportivo à seleção. E montaria uma tese instantânea a respeito.

E o Manhatan Conection? – Será que o Obama, depois de solapar o Lula na questão do Irã, teria armado uma conspiração para tirar o Ganso (já nem se fala do Neimar) do escrete canarinho? – O que diriam o Caio Blinder e o Diogo Mainardi? – E o Matinas Suzuki, que anda sumido, mas prefaciou a terceira edição brasileira de Hiroshima, de John Hersey? (livro essencial). Bela salada, concordam?

– Enfim, graças ao Dunga, tivemos um fim de semana mais reflexivo, com tempo para sopesar as análises da crise européia, o equilíbrio de forças na campanha eleitoral, o veto presidencial ao fator previdenciário, a habilidade do secretário Nacional de Justiça no Nintendo iiiiiih, a vitória daquele tailandês no Festival de Cannes (encomenda do Tim Burton aos jornalistas brasileiros, que jamais conseguiram pronunciar o nome do vulcão islandês, o Eyjafjallajoekull).
Isso, entre outras questões relevantes, como o próprio bloqueio do Dunga à seleção (que não durou dois dias): - Afinal, o técnico está certo ou errado de evitar o assédio capaz de comprometer a performance do nosso time nessa competição sui generis que é a Copa do Mundo?