terça-feira, 18 de outubro de 2011

O Pan e o brasileirinho


O Zé Teodoro não podia ter feito isso com Mick Jagger

A Globo elegeu a boa reportagem de sua afiliada, a TV Nordeste, sobre o empate do Santa Cruz com o Treze, da Paraíba, para fechar a sua edição do JN de ontem (17/10). O resultado garantiu o acesso do cobra coral à terceira divisão do campeonato brasileiro, depois de três anos de sucessivos rebaixamentos que levaram esse time, de larga tradição e grande torcida, à quarta divisão do certame, nos últimos anos. Mais um sinal, dentre múltiplos, da decadência do esporte no país, precipitada pela mercantilização excessiva e pela falência moral de seus dirigentes. Fatos cuidadosamente ignorados, sempre que possível, pela chamada imprensa esportiva, com suas cada vez mais raras exceções.

Antes, a âncora, Fátima Bernardes, leu uma breve nota sobre as vitórias da Natação brasileira no Pan, mas não respondeu à acusação de uso indevido de imagens da Record, pelo JN, no último sábado (15), feita pela emissora de Edir Macedo, momentos antes. A Record mostrou um fac símile de uma circular enviada às demais emissoras, antes do início dos Jogos, autorizando a reprodução de sua cobertura (exclusiva) da competição, desde que acompanhadas pelo respectivo crédito. A Globo não respondeu à cartinha e usou as imagens como se fossem da OTI (Organização da Televisão Ibero-Americana).

Mais patética do que essa polêmica, porém, são as tentativas dos jornalistas esportivos de pintar a melancólica mediocridade do campeonato brasileiro com as cores de uma encarniçada disputa. Se o Santos vier a ganhar a Copa Toyota, em dezembro, a frase de seu hino (campeão absoluto deste ano) não será mais uma rima, apenas uma confirmação (Mundo, mundo, vasto mundo). Esse esforço desmesurado de proteger suas receitas, no caso da Globo, não afeta apenas a credibilidade do seu grande jornal: toda a programação da emissora trabalha por isso, como numa ginástica laboral japonesa.

Em seu programa de relacionamento, o Bem Amigos, de ontem (17), por exemplo, o monagasco Galvão Bueno emprestou o seguinte corolário à estatística de seu colega, Renato Maurício Prado, sobre as 47 derrotas dos clubes mineiros nesta edição do brasileiro:

- Será que o Mineirão faz tanta falta assim? - Como sói acontecer, nessas ocasiões, ninguém concordou, nem discordou.

Claro que hoje, eu preferia analisar a cobertura do programa Segundo Tempo, no Ministério do Esporte, cujo histórico a imprensa parece ignorar, embora o ex-PM João Dias Ferreira, preso em 2010, durante a Operação Shaolin, ao ser acusado de desviar R$ 2 milhões do Ministério para construir a sua mansão, tenha envolvido, tanto o ex-ministro, Agnelo Queiroz, que trocou o PC do B pelo PT para eleger-se governador do DF, quanto o seu ex-secretário geral , o atual ministro, Orlando Silva.

Segundo o ex-PM, os desvios chegaram a R$ 40 milhões, parte dos quais teriam sido doados pelo PC do B ao PT, para cobrir despesas da campanha de reeleição do presidente Lula. Agnelo Queiroz sucede, no governo do DF, não nos esqueçamos, a Joaquim Roriz e José Roberto Arruda.

Também questiono a atitude da mídia em relação aos protestos anti-corrupção, menosprezados pelos analistas políticos, por falta de um comando partidário, embora a tropa de choque do PT tenha se apressado em aplicar, às manifestações, o sempre conveniente rótulo de armação da direita. As passeatas clamavam, justamente, pela indignação pública diante daquilo que de pior representam as agremiações partidárias, entre elas o PT, protegidas no ventre precocemente apodrecido de nossa jovem democracia. O que esses meninos justamente rebelados, em seus computadores, faixas e cartazes, é de quantos Newtons são necessários para se acelerar a massa de um Berlusconi ou de um Ricardo Teixeira.

Os telejornais também não deram importância ao movimento de ocupação de Wall Street, intitulado, inicialmente, de manifestação anti-capitalismo (restrita à elevação da taxa de desemprego dos EUA) e renomeada, depois de uma semana, de protesto contra a ganância das instituições financeiras. Sérgio Augusto (ex-Pasquim) publicou uma boa reportagem sobre o fenômeno, no Estadão de 16/10, incluindo o seu aproveitamento por oportunistas do peso de um Jimmy Hoffa Jr, como reação pró-Obama ao Tea Party. "Sem bridão ideológico, sem líderes, sem violência e sem megafone (por conta da Lei do Silêncio), a o evento obrigou os oradores a desenvolver uma nova forma de interação, na qual grupos mais próximos aprenderam a passar adiante, em coro, as mensagens ouvidas aos grupos subseqüentes".

"Eles não se afligem, embora ainda não saibam até onde irão", relatou Sérgio Augusto. "O processo, não a plataforma, é o que importa", observou Hendrick Hetzberg, da New Yorker. "Mudou o mundo e também a estratégia dos indignados" (volto a Sérgio Augusto). "Eles não pegam mais carona nas grandes reuniões como Davos e o G-8. Agora, o grande evento é a manifestação. O OWS (Occupied Wall Street Journal) já ocupa mais o noticiário do que qualquer outro tema político. Lideranças, se necessárias, surgirão, mas Jimmy Hoffa não será uma delas".

Gozado: nem colando o meu ouvido ao chão consegui captar uma análise semelhante, nem do melhor time de Política e Economia da televisão brasileira, conforme a autoavaliação de Lucas Mendes, que já teve, em seu Manhatan Conection: Lúcia Guimarães, Paulo Francis e Nelson Motta. Antes, claro, de trabalhar com seus atuais colaboradores, Caio Blinder, Ricardo Amorim e Diogo Mainardi. A entrevista de Marília Gabriela com Sabrina Sato, no mesmo horário do último domingo, estava mais interessante.

Mas, em matéria de telecatch intelectual, preferi uma terceira briga, a dos Fernandos mineiros, o Morais versus o Mitre, que esgrimaram sobre o regime cubano: segundo o primeiro, o Cuba exibe o menor índice mundial de mortalidade infantil. Para o antagonista, o país deve ser lembrado como aquele que proibiu a circulação do livro do primeiro, A Ilha, no domicílio que o inspirou. Talvez por considerá-lo excessivamente realista. O último livro de Morais, tema central da entrevista, me pareceu mais interessante: Os últimos soldados da guerra fria.

Mas o melhor da minha Semana na Tevê me foi reservado para o breve trecho do CQC, Top Five, de ontem (17), mostrando um diálogo entre a animadora de auditório, Eliana, e um garoto de aproximadamente seis anos:

- Que parte você prefere, na creche: a professora, os coleguinhas ou as brincadeiras?
- Nenhuma – respondeu o garoto. – Gosto de ficar em casa.
- Eu vou perguntar mais uma vez, insistiu Eliana, do que você gosta mais, da professora, dos amiguinhos ou das brincadeiras?
- Da hora de ir embora, finalizou a criança - dando-me a impressão de ser o único adulto naquela conversação.