terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Cruzada Global



Não é segredo que a Globo elegeu o Islã como o nosso principal inimigo (a emissora nunca entendeu os limites entre a sua linha editorial e a consciência da nação) depois de enterrar, com uma pompa ritual, em novembro último (20.0 aniversário da queda do muro de Berlim), a internacional socialista, considerada, durante muito tempo, a maior ameaça ao conforto e aos privilégios da elite dominante, envelopados nos valores intocáveis como o empreendedorismo e a liberdade de expressão.

Além da ambição, considerada saudável pela civilização que a Globo julga proteger e por uma juventude que não vê problema em distribuir rasteiras no trabalho e gastar o que ganha com gadgets e outros prazeres fúteis, os colunáveis de Limeira (Oliveira e Ambruster, os reis do combustível adulterado) mostraram que, ao contrário do que propunham Marx e Engels, a manipulação e a fraude são mais interessantes do que a solidariedade e as oportunidades iguais para se alcançar os carrões, as lanchas e os helicópteros.

Você pode observar (infelizmente, a maioria não pode): sempre que alguma notícia desagradável para o mundo ocidental precisa ser divulgada – como o recente massacre de 27 civis no Afeganistão – a emissora providencia um lenitivo para antecipar a nota constrangedora.

No letreiro da Globonews de ontem à tarde (22/02), durante o simpático Via Brasil, a anestesia foi a declaração de culpa do afegão Najibullah Zazi, 25, sobre o ataque planejado para o metrô de Nova York, em outubro do ano passado. Logo depois, veio a nota sobre o massacre de civís afegãos. Perguntar por que o tal suspeito decidiu confessar justamente ontem, seria esperar demais dos meus antigos coleguinhas globais.

No JN, a escolha foi outra: o Irã anunciou a construção de mais duas usinas nucleares, sob severo protesto de Israel, que considera leves demais quaisquer sanções econômicas ao país inimigo. Para meu espanto, o jornal também mostrou imagens de predators recentemente adquiridos pelos israelenses, sem explicar, obviamente, tratarem-se de bombardeiros não-tripulados que têm sido alvo de sérios questionamentos éticos nos próprios EUA, fabricantes dessa peça de artilharia. A emissora nem de longe mencionou a condenação da União Européia à operação que matou Mahmoud Abdel Raouf em Dubai, no dia 19 de janeiro último.

Ao contrário do que os amigos de ambos os lados propugnam – que é impossível não tomar um partido nessa disputa – eu me recuso a fazê-lo. Mas não consigo ficar indiferente à manipulação da opinião pública, o que é muito diferente de se defender um ponto de vista, analisando opiniões equidistantes, como eu aprendi naquela casa (O Globo), nos meus primeiros anos de jornalismo, de chefes como o Evandro Carlos de Andrade, em plena ditadura militar.