Há algum tempo, se o dono de uma daquelas redes concessionárias de veículos chineses dissesse que foi obrigado
a vender um de seus aviões por causa da crise, a gente o definiria como um noveau riche. Um Jay Gatsby do 3o Milênio. O mesmo adjetivo serviria para enquadrar a
Xuxa, pela casa em Trancoso-BA, ou a Fernanda Torres, pelo condomínio
em Itacaré-BA. Mas, principalmente, o Ricardo Teixeira, cuja mansão, em Sunset
Island-FL,é de fazer inveja à nova atração do SBT, o cirurgião plástico, Doctor Ray.
Depois das administrações petistas, o bom gosto virou coisa de elite, você sabe. Como parte dessa revolução cultural, passamos a
identificar o mau gosto de quem tem dinheiro sobrando como coisa de novo rico, não mais de noveau riche: a festa de casamento com
desperdício de caviar e lagosta dos Sarney; o palácio do cantor sertanejo, Zé Rico e o castelo do deputado mineiro, Edmar Moreira.
Sultões seguidos pelos respectivos haréns e
sacolas de grife pelos corredores da Harrod’s, em Londres, peruas desfilando na Vittorio Emanuelle II, em Milão, e uma vasta lista de objetos que vai da pulseira de
ouro do Raul Gil até a Mesquita Sheik Zayed, em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes,
que custou para lá de US$ 1,5 bi - é tudo coisa de novo rico.
Entre os que subiram na vida, como a galera aí acima, notamos um ligeiro incremento de maus hábitos, como jogar lixo no chão; dirigir falando ao celular (se possível, com os pés sobre o painel do
veículo); música em alto volume; falar alto (inclusive no
cinema) usando palavrões; furar fila; usar adesivo alardeando
a própria fé (mesmo quando o possante veículo estaciona em vaga para deficientes físicos). O "novo normal". Ah, e criticar esse tipo de atitude, agora, é preconceito.
Na era do funk-ostentação, os tênis, carrões e farras dos
jogadores de futebol em Ibiza-Espanha vêm se juntar aos raybans estilo janelão, bolsas Luis Vuitton compradas à vista, como a da MC Pocahontas (“Mulher de Poder”). Isso, e aqueles fins de
semana em Nova York para renovar o guarda-roupa (a pretexto de atualização cultural);
óculos de armação colorida, camarote de balada e longnecks de loja de conveniência. O brega, enfim, caiu em desuso.
No meu caso, depois das administrações petistas, a minha categoria social se inverteu: de classe média ascendente, virei novo pobre. Novos hábitos, aqui vou eu:
Adeus, Booking.com: visitas a amigos e parentes
que moram de outras cidades têm que incluir hospedagem. Posso lavar a louça, passear com o cachorro e varrer o quintal;
Benvindo, Home Office!: o aluguel de um espaço para a pequena ou média empresa tornou-se inacessível.
Pão de Açúcar, nunca mais: compras, agora, só nas redes de varejo controladas por empresários russos ou chineses; em sacolões, ou no varejão do Ceagesp.
Olá, OLX: móveis e utensílios, a partir de agora, somente em sites de trocas e objetos usados. Para roupas, melhor 'garimpar' nos brechós.
Tudo é Marrakesh: um real economizado na compra do brócolis, outro nas bananas e cinquenta centavos na cebola, podem render duas abobrinhas.
Leitura do Momento: “Caminhando”, de Henry Thoreau.
Whisky e Bourbon, adeus! - a cachaça cumpre muito bem esse papel. Saúde em primeirio lugar. Aliás...
Remédio bom é remédio barato. Viva a Farmácia Popular.
Minha nova condição social trouxe alguns confortos: não sou mais um shopper, nem um foodie. Virei hipster (foto): a minha moda, sou eu quem faço. Fiquei longe de bares e livrarias, esses antros de vício e depravação; igrejas, também não frequento: o dízimo está pela hora da morte e o céu, continua em local incerto e não-sabido. Mas não deixei de sair de casa, como medo que o síndico achasse que morri, como aquele
personagem do Will Eysner, Pincus Pleatnik, que, depois de ter o nome publicado, por engano, no
obituário do jornal, nunca mais conseguiu provar que continuava vivo.