sexta-feira, 31 de julho de 2009

Resiliência

Vinte empresas foram multadas pelo PROCON-SP ontem (30) por descumprir as novas regras do telemarketing que exigem o atendimento do cliente em menos de um minuto (Decreto 6.523). Três sofreram as maiores punições e tiveram suas marcas reveladas pela grande imprensa (FSP, OG, OESP, Joven Pan-SP). As verificações do Procon ocorreram nos meses de dezembro de 2008 – quando as novas normas entraram em vigor – e em março deste ano. Uma das três empresas disse que vai recorrer da punição, a outra estuda fazê-lo.

Minha primeira reação foi comemorar em silêncio: há dois dias, liguei para um fabricante de eletrodomésticos (minha TV, recém-adquirida, apresentou defeito) e fui atendido em menos de 10 segundos: a resposta da opção 4, Reclamações, foi de que eu acionara um número inválido. Ontem, liguei para uma companhia aérea, para trocar milhas por uma passagem. Fui atendido em menos de 20 segundos, mas passei por seis instâncias e esperei sete minutos para falar com a operadora. Infelizmente, ser atendido em menos de um minuto não garante um bom atendimento.

Teoricamente, a punição às empresas apontadas pela mídia representa um dano de imagem a marcas que, em face desse desgaste, se esforçariam para melhorar a sua conduta. Teoricamente. Das três empresas que receberam as maiores punições do PROCON, uma é líder no ranking de qualidade no atendimento da agência reguladora de sua atividade, que considera, além do tempo de resposta, indicadores mais precisos e mais abrangentes. A outra – que não está mal posicionada nesse mesmo ranking – veicula, neste momento, por meio de campanha de massa, uma das promoções mais atrativas que se tem notícia, nesse mercado. A terceira é tida como a melhor (ou a menos ruim) no seu setor de atividade e patrocina - como gente grande - a modalidade esportiva da qual o país mais necessita de apoio e investimento, o Atletismo.

Nos três casos, a forte resiliência das marcas apontadas como as vilãs de uma regulamentação pouco efetiva e nada eficaz se não anulou, pelo menos atenuou significativamente o impacto das punições. Prova de que, no choque do investimento sustentado na imagem de marca com uma ação apoiada no marketing da denúncia pela denúncia (sem um exame mais criterioso de seus motivos), esta segunda força se destrói.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Mais lenha para a discussão (vide post 01/07 Quem Patrocina a Seleção?)

Folha de S.Paulo, 30 de julho de 2009 - página D5
JUCA KFOURI
Deixem Jesus em paz

Está ficando a cada dia mais insuportável o proselitismo religioso que invadiu o futebol brasileiro


MEU PAI , na primeira vez em que me ouviu dizer que eu era ateu, me disse para mudar o discurso e dizer que eu era agnóstico: "Você não tem cultura para se dizer ateu", sentenciou. Confesso que fiquei meio sem entender. Até que, nem faz muito tempo, pude ler "Em que Creem os que Não Creem", uma troca de cartas entre Umberto Eco e o cardeal Martini, de Milão, livro editado no Brasil pela editora Record.


De fato, o velho tinha razão, motivo pelo qual, ele mesmo, incomparavelmente mais culto, se dissesse agnóstico, embora fosse ateu. Pois o embate entre Eco e Martini, principalmente pelos argumentos do brilhante cardeal milanês, não é coisa para qualquer um, tamanha a profundidade filosófica e teológica do religioso. Dele entendi, se tanto, uns 10%. E olhe lá.

Eco, não menos brilhante, é mais fácil de entender em seu ateísmo. Até então, me bastava com o pensador marxista, também italiano, Antonio Gramsci, que evoluiu da clássica visão que tratava a religião como ópio do povo para vê-la inclusive com características revolucionárias, razão pela qual pregava a tolerância, a compreensão, principalmente com o catolicismo.

E negar o papel de resistência e de vanguarda de setores religiosos durante a ditadura brasileira equivaleria a um crime de falso testemunho, o que me levou, à época, a andar próximo da Igreja, sem deixar de fazer pequenas provocações, com todo respeito. Respeito que preservo, apesar de, e com o perdão por tamanha digressão, me pareça pecado usar o nome em vão de quem nada tem a ver com futebol, coisa que, se bem me lembro de minhas aulas de catecismo, está no segundo mandamento das leis de Deus.

E como o santo nome anda sendo usado em vão por jogadores da seleção brasileira, de Kaká ao capitão Lúcio, passando por pretendentes a ela, como o goleiro Fábio, do Cruzeiro, e chegando aos apenas chatos, como Roberto Brum.

Ninguém, rigorosamente ninguém, mesmo que seja evangélico, protestante, católico, muçulmano, judeu, budista ou o que for, deveria fazer merchan religioso em jogos de futebol nem usar camisetas de propaganda demagógicas e até em inglês, além de repetir ameaças sobre o fogo eterno e baboseiras semelhantes, como as da enlouquecida pastora casada com Kaká, uma mocinha fanática, fundamentalista ou esperta demais para tentar nos convencer que foi Deus quem pôs dinheiro no Real Madrid para contratar seu jovem marido em plena crise mundial.

Ora, há limites para tudo.

É um tal de jogador comemorar gol olhando e apontando para o céu como se tivesse alguém lá em cima responsável pela façanha, um despropósito, por exemplo, com os goleiros evangélicos, que deveriam olhar também para o alto e fazer um gesto obsceno a cada gol que levassem de seus irmãos...

Ora bolas! Que cada um faça o que bem entender de suas crenças nos locais apropriados para tal, mas não queiram impingi-las nossas goelas abaixo, porque fazê-lo é uma invasão inadmissível e irritante. Não mesmo é à toa que Deus prefere os ateus...

domingo, 26 de julho de 2009

Teorema de Waack


O médico do piloto Felipe Massa, Dino Altmann, afirmou, na manhã deste domingo (26), que segundo o neurologista que trata do caso do brasileiro, houve uma melhora no quadro de saúde do piloto. "Ele tem um pouco de afundamento do osso, mas não tem lesão no tecido nervoso do cérebro. O olho não foi afetado. O osso que envolve o olho, que a gente chama de órbita ocular, teve uma fratura. Isso faz parte da lesão que ele teve, mas isso não deve trazer nenhum problema para a visão. É uma situação grave, mas risco iminente de morte, na minha opinião, não existe", disse (Uol, 26/07, 9h01). Uma vez que o moço está fora de perigo, podemos conversar sobre a cobertura da TV Globo, neste fim de semana de poucas notícias nas redações.

O tom dramático da matéria de abertura do Jornal Nacional de ontem (25) sedimentou a chamada no estilo Aqui, Agora do melhor âncora da TV brasileira, William Waack (prêmio Comunique-se 2009), por volta das 19h30 daquela mesma data: o jornalista escondeu o adjetivo induzido por trás do coma do piloto. Foi para garantir mais alguns pontos de Ibope ao maior jornal da tevê brasileira ou por alguma outra razão? - O que deu em você, Waack? perguntei-me, na mesma hora.

Na abertura do JN, Carla Vilhena pareceu tentar compensar a derrapagem: ela destacou a palavra induzido ao falar do coma de Massa, ao contrário do parceiro, momentos antes. Já a matéria da repórter Mariana Becker foi para o ar do jeito que deu: “Felipe Massa sai reto da curva, bate na barreira de pneus e não mexe mais a cabeça. Desacordado, não muda de direção. A pista é rastreada pelos fiscais. A espera por notícias de um dos pilotos mais populares da fórmula um pára o treino, cala o autódromo. A busca de informações começa entre as equipes. Os companheiros dele, o irmão, Edu, estão suspensos numa expectativa assustadora. Ele é atendido na pista, coberto por lençóis e levado ao Centro Médico”. Praticamente um enterro, ironizou um sobrinho (engenheiro) que assistia ao noticiário ao meu lado, certo de que a situação não era tão dramática.

Coube a Galvão Bueno, tão criticado, o solo da gafieira, na terceira reportagem da edição sobre o assunto (a segunda foi A Viagem da Família para a Hungria, que terminou com um close da esposa do piloto, Rafaela, pedindo orações às pessoas que tem fé). Na qualidade de uma das sete pessoas que tiveram acesso centro cirúrgico, Galvão falou: “É bom que se explique isso, que o coma induzido não tem nada a ver com estado de coma. É muito sedativo para que ele descanse ao máximo”.

Eu me recuso a discutir, neste espaço, o entusiasmo da repórter (ela fazia uma cobertura esportiva), mas o Teorema de Waack me chamou a atenção: - Afinal, foi um deslize do profissional de alta envergadura (com fama de elitista) que trabalha num veículo de massa, ou uma falha da emissora, cada vez mais ameaçada pela concorrência, nessa arena em que o Pedro Bial é disputado a peso de ouro com a TV do Sílvio Santos? A explicação de William, na passagem para Galvão, não me ajudou a elucidar o enigma: "Fiquei gelado ao saber da notícia, lembrando a morte de Aírton, mas agora, graças a Deus, uma coisa parece não ter nada a ver com a outra", explicou o âncora.