quinta-feira, 4 de março de 2010

Terremoto


Foto de Danny Alveal (EFE): Caixas de comida sendo preparadas para serem enviadas a Concepción no 4.0 dia do terremoto (2/3).
O rigor editorial (possivelmente atrelado à política comercial) e o showrnalismo estão matando a tradição jornalística do nosso companheiro, Roberto Marinho, não obstante a diligente formação por ele proporcionada a pelo menos dois filhos, João Roberto e José Roberto – que foi nosso colega na saudosa redação da rua Irineu Marinho, 30. Mas problemas de sucessão familiar são recorrentes na imprensa brasileira. Dona Lilly foi mais sábia na decisão de leiloar seus pancettis e dicavalcantis. Embora o Arnaldo Jabor goste de dizer que comunista pensa pedra, os do Dr. Roberto, como ele próprio os definia, eram disciplinados. Talvez por isso, o jornalismo da Casa, nos anos 70, fosse modelo no, apesar e acima da ideologia patronal – que incluía os irmãos Ricardo e Rogério.

Tenho me sentido uma espécie de ombudsman gratuito da Rede Globo, ultimamente. Para cortar esse prazer deletério, prometo interromper, depois deste post, as observações à atuação da velha Casa no exercício da honrosa profissão. Mas não consegui ficar inerte diante do nítido envergamento da cobertura do Jornal Nacional ao terremoto do Chile, que denunciou seguidamente o vandalismo do povo de Concepción enquanto o proscrito Luiz Carlos Azenha (meu foca, no Diário de Bauru-SP, com orgulho), na arquirrival Record colocava no ar, desde o seu primeiro dia de Chile (1/3), depoimentos sincopados pela emoção de pessoas desesperadas com a sede, a forme e o desamparo. Azenha nunca foi de engolir versões oficiais e, talvez por isso, tenha sido banido da Globo. Melhor destino teve o Bial – colega de época – que virou apresentador de BBB.

Marcos Uchoa talvez seja o melhor, dentre os bons repórteres da casa, mas sucumbiu à pirotecnia, também levado pelo hábito: timing, informação abrangente, passeios de câmera, boas imagens, parábolas perfeitas. Mas, para todos os efeitos, o sofrimento daquela população que já padece de tantos males sociais e de uma ansiedade derivada de um sentido de urgência imposto pela própria mídia (que nos atinge a todos, sobretudo nos momentos de angústia) desapareceu de cena. Para os telespectadores da Globo, o povo chileno, de civilizado, virou um bando de selvagens que na primeira oportunidade sai matando, incendiando e roubando como se fossem de outro país.

Só no terceiro dia (ontem, 3/3) o nosso editor-âncora, com a sua habitual expressão de vocês-sabem-o-peso- que-eu-carrego comandou a mudança de tom da emissora, justificando o desespero da população diante da demora no socorro às vítimas e da presença do exército em Concepción. Bonner levantou, finalmente, o sombrolho franzido diante da suposta baderna dos chilenos. Não era sem tempo, pensei, mastigando, como todos nós, a tragédia seguinte, que nos impediu de digerir a primeira: na Cidade de Deus, 13 passageiros de uma lata de sardinhas foram queimados por um bando de selvagens autênticos, apagando a glória do coronel da véspera que, tão supostamente quanto o deputado da meia, barganhou um carro roubado com traficantes e perdeu um soldado valoroso.

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