sexta-feira, 24 de julho de 2009

De Zelaya a Caetano



O que a imprensa nos trouxe de mais importante nesta semana? – As falcatruas da família Sarney? – A luta de Zelaya para voltar ao poder? – As novas explicações de Temporão para o descontrole da Gripe Suína? – O risco eleitoral que o Celso Ming queria ver na ata do Copom, ou o menor nível de desemprego do ano? – Para alguns, a troca de farpas entre Hillary Clinton e Pyongyong foi mais instrutiva, em outros corações, a desmontagem do Corinthians calou fundo.

Na minha opinião, porém, se as faculdades de Jornalismo ainda existissem, a peça de estudo da semana seria a entrevista de Caetano Veloso à Folha de S. Paulo, na Ilustrada desta quarta-feira (22), exemplo do que o jornalismo ainda pode produzir. Um amigo (jornalista) comentou: “Guardei para ler à noite por saber que quando ele fala, sempre se aproveita alguma coisa”.

Por ter envelhecido junto (bem), a nossa geração se reconhece no artista: “Tenho saudade da alegria física da juventude, da elasticidade do corpo, do jato forte da urina, das ereções firmes” (leituras de Phillip Roth); “Passei a ser programaticamente antirreligioso porque ser antirreligioso me parecia uma repressão da religiosidade”; “Disse a Gil que ele seria no máximo um Lula do Lula” – Onde mais se leria essas frases?

Seguem trechos de notícias de guerra, para forçar a comparação: “Micheletti é um gorila que cometeu assassinatos, violação de direitos humanos e traição”; “O toque de recolher não provocou danos porque a atividade produtiva funciona de dia”. Ou: “Só podemos considerar a sra. Clinton como uma dama engraçada que às vezes parece uma aluna no ensino básico, outras, uma aposentada indo às compras”. Ou, ainda: “Alguns dos presos confessaram trabalhar para inimigos estrangeiros com o objetivo de desestabilizar o Irã”.

A cuidadosa edição da entrevista de Caetano Veloso, no fio da navalha, e detalhes como o precioso título, “Caetano estrila” (estrela?) sobre o rosto congestionado do artista, ou o registro discreto “nesta entrevista que ele preferiu fazer por e-mail” não esconderam a origem do evento, no jornal que não resiste à polêmica. Além do marketing da mosca que nasceu pra lhe abusar, transpareceu a gostosa nostalgia dos Comentários da Semana, de Machadão, no Diário do Rio de Janeiro (1861), das polêmicas de Pessoa e Sá Carneiro na Lisboa do começo do século e das crônicas de Carlinhos Oliveira no Diário Carioca e JB dos 60 a 80.

Pouco importam a Lei Rouanet , as rabugices do artista ou a independência eventualmente demagógica da Folha: o conteúdo, como se diz hoje em dia, vale o seu tempo.

Um comentário:

  1. salve, Topin!
    já tinha lido, e a entrevista do Caetano é isso mesmo o que vc disse.
    Polêmica Folha X Caetano é algo tão previsível que parece fazer parte de estratégia de lançamento do filme. Que a estrela estrila sempre soubemos.
    Mas dane-se, o velho moço manda muito bem.
    E quando nos damos conta de que nada musical consistente se cria mais, fica evidente como era raro o talento dele, ou como foi raro aquele tempo de mil talentos.
    abração
    sp

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