terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sandy encontra Eli Pariser




Logo eu, que detesto esses títulos feitos para atrair o leitor


O teaser da entrevista de Sandy à Playboy explodiu como um caixa-eletrônico na reputação de seu irmão, Júnior, como era de se prever, inclusive pelos gênios de marketing da revista, que têm, como requisito obrigatório para o exercício da atividade, um MBA em machismo pré-diuluviano pela universidade livre de Parada de Lucas-RJ. Nem por isso, a revista séria da Casa deixou de exibir, uma semana depois, uma de suas mini-entrevistas com o vereador Carlos Apolinário (DEM-SP), que consumiu parte do nosso tempo e recursos elaborando o projeto de Lei para o Dia do Heterossexual.

Tudo em nome do marketing, ciência que acaba de descobrir uma fórmula capaz de me afastar não apenas das lojas de shoppings, invadidas pelas guloseimas e aromatização de ambientes, como também dos bares, onde os marqueteiros estão lançando a música capaz de induzir o cliente a escolher esta ou aquela marca de bebida. Canoas do Tejo, de Carlos do Carmo, venderá, provavelmente, litros de tinto alentejano; Mud Watters vai incrementar as vendas de bourbon e Waldick Soriano vai expandir o consumo de Amansa Corno. Deve ser conspiração dos AAA, mas em alguns casos, como o do Jaguar, duvido que dê certo.

Para Camila, que reclama das minhas citações: Jaguar, alcoólico notório, é um dos fundadores de O Pasquim, jornal criado por um bando de almas perdidas, nos anos 70, para rir da moral, dos costumes e da ditadura da época, e no qual o seu pai, então jovenzito de 20 anos, experimentou a glória efêmera de publicar uma página de cartuns, apresentado por Henfil, o autor dos Fradinhos, cujos originais você pôde ver, recentemente, numa exposição do CCBB.

Como as coisas mudaram! - O PMDB de Michel Temer, Wagner e Baleia Rossi chamava-se, então, Movimento Democrático Brasileiro e era comandado pelo deputado Ulysses Guimarães, parceiro de Franco Montoro e, mais tarde, de Teotônio Vilela. Progressista, como se convencionou chamar o partido atual de Paulo Maluf, era sinônimo de socialista, expressão que atualmente define a agremiação pela qual candidatou-se a governador de São Paulo, nas últimas eleições, o presidente da Federação das Indústrias, Paulo Skaff. Depois, eu explico melhor.

Com tanto lixo a ser varrido pela imprensa, nos últimos dias, a revista séria que tinha perdido prestígio e leitores por exibir uma cobertura excessivamente enviesada, em oposição aos representantes do povo que assumiram o poder, há cerca de uma década, voltou a despertar interesse, tanto por parte do cidadão comum, como da grande imprensa, pautada, nas últimas semanas, por suas investigações e denúncias, todas concretas e nada surpreendentes.

O Estadão ainda não se pronunciou a respeito, mas eu diria que as instituições correm perigo. Nem tanto pela generosidade do BNDES com os grandes grupos privados, nem pela abertura de novas áreas da Amazônia para a mineração e para as hidrelétricas conforme MP publicada no Diário Oficial de ontem (15), ou por uma eventual redução da taxa de juros para combater a crise internacional de demanda, algo que nunca dantes, nem depois, neste país, se fez acompanhar pelo aperto fiscal recomendado pelos analistas de plantão.

É que as pessoas de bem, às quais referiu-se a presidente Dilma, ao apoiar as investigações de corrupção em seus ministérios (“Queremos uma justiça eficaz e célere, mas sóbria e democrática”), infelizmente, estão desaparecendo.

O assassinato da juíza Patrícia Acioli na última sexta-feira (12), por exemplo, revoltou a sociedade e mobilizou o Tribunal de Justiça e o governo do Estado do RJ em defesa de outros magistrados ameaçados de morte pelas quadrilhas de milicianos que esses juízes estão empenhados em combater. O caso migrou rapidamente do noticiário policial para o político, mas, nos telejornais de sábado (13), ainda se levantavam dúvidas quanto à natureza do crime, porque a juíza registrara, há alguns meses, uma queixa por agressão motivada por ciúme, contra o seu namorado, Marcelo Proubel, que é policial militar.

A falta de segurança para os juízes linha-dura como Patrícia (cerca de 70 estão ameaçados) sepultou um outro assunto que a imprensa levantara, na semana anterior, a partir de uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça, revelando a gravidade e a extensão da corrupção nesse poder que não consegue proteger a sua banda saudável, mas que pressiona o governo, neste exato momento, por reajuste salarial.

A manipulação da informação e as distorções hoje atribuídas à banalização do marketing viral, porém, não se limitam à imprensa séria. Por frequentar vários telejornais simultaneamente, ouvi, num programa de fofocas da TV, na semana passada, a seguinte chamada: “Atriz da Globo reclama de cenas sensuais que foi obrigada a gravar”. Por se tratar de emissora concorrente, prestei atenção: a reportagem falava de Alinne Moraes e, logo depois, fechava com a seguinte frase: “A atriz diz não ter se importado de gravar cenas tórridas para a novela porque isso faz parte da profissão”. Inacreditável.

Mas não é tudo. Um amigo me chamou a atenção para uma rápida palestra do ativista norte-americano Eli Pariser, em maio deste ano, que pode ser acessada no site de conferencias TED (link abaixo) e que começou com a seguinte observação: “Um jornalista perguntou a Mark Zuckerberg (fundador do Facebook) porque as atualizações de notícias na web são tão importantes, ao que ele respondeu que um esquilo morto no jardim de sua casa provavelmente atrairá mais o seu interesse do que milhares de pessoas morrendo, nesse mesmo instante, na África”.

Parêntesis: o nosso maior portal de notícias passou a maior parte do dia de hoje (16) exibindo, em sua página de frente, fotos dos atletas Lucas, comemorando o aniversário diante do próprio pôster de três metros de altura e Neymar, vendendo cosméticos. Fechando os parêntesis: a frase de Pariser introduziu o seu alerta para os filtros da Internet que ele, na infância, julgava ser a sua grande janela para o mundo.

O ativista explicou que gostava de conhecer as opiniões dos conservadores, embora tivesse mais amigos progressistas e que, depois de algum tempo, os seus acessos a esses conservadores, via Facebook, foram banidos de sua página. Esse dirigismo, conforme revelou, foi, mais uma vez, constatado quando dois de seus amigos com repertórios (backgrounds) distintos buscaram, no Google, a palavra Egito: um recebeu links de fatos políticos e rebeliões e o outro, de destinos turísticos.

Pariser é bem intencionado e tem razão, mas atuou nos bastidores da campanha que levou Barak Obama a diferenciar-se dos oponentes e ganhar as eleições norte-americanas em 2008 usando, entre outros recursos, a vinculação dos eleitores à sua candidatura via pequenas doações (que tornaram esses contribuintes uma espécie de consumidores de sua candidatura) e usando o Twitter para transmitir os fatos mais importantes da campanha a seus seguidores, entre eles, subrepticiamente, os jornalistas da media mainstream, como eles a chamam.

Em tempo: Eli Pariser nunca se encontrou com a cantora Sandy, assim como Alinne Moraes nunca reclamou da TV Globo. http://www.ted.com/talks/eng/eli_pariser_online_filter_bubbles.html

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