Piau, homônimo do novo relator do Código Florestal (foto: www.lucianocandisani.com.br)
A votação do Código Florestal me trouxe memórias da infância: tira, põe, deixa ficar. Enquanto eles jogam caxangá, o produtor cabeçudo mete a corrente na mata ou destrói os manguezais, e os que têm consciência pagam, com os efeitos do clima. Acampei na Vargem Limpa, em Bauru-SP, quando era garoto. Hoje só resta, no local, a sede de um zoológico que lembra um circo falido; acompanhei, como repórter, a fundação de Terra Nova (MT) por posseiros expulsos de terras guarani, em Nonoai (RS) e Chapecó (SC); entrevistei, várias vezes, os irmãos Villas Boas, em aldeias indígenas; casei-me com a filha de um ex-fazendeiro, tenho amigos produtores e vejo o Globo Rural todos os domingos (um dos poucos programas jornalísticos que resistem, na TV aberta). Mas me dói ver a ganância avançar, inapelavelmente, sobre o que nos resta de recursos naturais, diante de um governo que se mostra, ora complacente, ora incapaz.
“Vamos nos falando”, diz a namorada ao garoto que não pretende ver nunca mais. A hipocrisia dos ruralistas em relação ao projeto do Código é mais ou menos a mesma. O projeto aprovado em novembro, com várias concessões da base de apoio do governo (na época, liderada pelo atual ministro do Esporte, Aldo Rabelo) foram muitas. De nada valeu o capital político acumulado pela ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, nas eleições presidenciais, na resistência a esse modelo. O projeto foi engolido, com todas aquelas mudanças, tanto por ambientalistas, como pelas “pessoas normais”. Com as reformas que o atual relator, deputado Paulo Piau (PMDB-MG), apresenta agora, o novo Código não tem chance de ser aprovado, e o governo, com toda a sua visão desenvolvimentista, sabe disso.
No último Globo Rural (o programa), a matéria central falou do tambaqui, cujas costelas eu e o Corá costumávamos assar na brasa, antes que o peixe desaparecesse do seu habitat natural (o Corá também se foi, infelizmente, há um ano); e do pirarucu, que fornecia o melhor filé de peixe de água doce que se podia encontrar, antes da espécie estar ameaçada de virar mais um zumbi, como a repórter explicou (em outras palavras, é claro). Piscicultores e zootécnicos já estão conseguindo “enganar” o pirarucu, a fim de promover a sua reprodução em tanques artificiais, o que deve gerar alguma coisa que poderíamos situar entre o chester e o kiwi. Ração gorda e águas tranqüilas: quem pode resistir?
Quanto ao piau, gosta de queijo, milho e salsicha, segundo os especialistas. Trata-se de um peixe muito arisco e difícil de ser fisgado.Mas já pode ser encontrado em alguns pesqueiros, de acordo com os sites de pesca. Não se sabe por quanto tempo vai resistir, em seu ambiente natural. Poderíamos perguntar ao ministro da Pesca, Marcelo Crivella, do PRB, o sobrinho-herdeiro do bispo Edir Macedo, mas ele já disse que não sabe nem botar a minhoca no anzol. Não se sabe que tipo de isca teria convencido o relator do Código Florestal, Paulo Piau, a endossar as novas demandas dos ruralistas, mas se ele for arisco como a espécie da qual leva o nome, bastará uma lente de aumento sob o sol para fazê-lo mudar de idéia.
Nos últimos dois dias, contudo, a grande preocupação nacional tem sido a falta de combustíveis na cidade de São Paulo, palco de uma outra disputa, que não esconde o embate entre o projeto de poder do governo petista e uma oposição que não pode abrir mão do seu principal núcleo de resistência, o Estado mais poderoso do país.
Nos telejornais de hoje (7/3), além da falta de gasolina, o fato do dia foi a briga do Beto Barbosa com suas duas acompanhantes, que foi parar numa delegacia do Campo Belo, bairro nobre da Capital. Nos sites de conteúdo, a cobertura do esporte e do Big Brother deu espaço ao Dia Internacional da Mulher. Nos jornais, uma outra disputa, entre a Fifa e o governo brasileiro, continuou repercutindo, embora o principal assunto fosse, mais uma vez, o PIB e a guerra cambial.
O Banco Popular da China prometeu ampliar seus investimentos em euros para ajudar os países da Europa a sair da crise. Como é que eu, na minha juventude maoísta, poderia pensar nisso? – O meu vizinho chinês, a propósito, trouxe os pais para morar com ele. Com o casal, um novo chow-chow que, em companhia do primeiro, interdita o elevador de serviço sempre que os dois têm que sair para fazer xixi. No elevador do escritório, fico sabendo que o produtor francês de beterraba decidiu investir na cana brasileira, outro aparente contrasenso.
No Manhattan Conection, Diogo Mainardi qualifica de perfeitos imbecís os blogueiros que, segundo ele “estão pautando a imprensa”. - Será que ele se refere ao bate boca entre o Paulo Henrique Amorim e o Heraldo Pereira? - Bem, polêmicas e convicções à parte, para o Diogo, perfeito imbecil é todo aquele que não pensa exatamente como ele. Rapaz solitário? –Vocês não conheceram o pai do moço, o publicitário Enio Mainardi. Para o crente, a propaganda religiosa é profissão de fé. Para o louco de amor, rejeição é perfídia. Para o militante político, loucura é paixão. Jerome Valcker ou Aldo Rebelo? - Borges ou Cortazar, pode ser? – A propósito dos argentinos, será que a presidente Cristina Kirchner vai mesmo proibir a importação de consolos masculinos?
Voltamos ao câmbio valorizado: ele vai promover, afinal, a desindustrialização de países emergentes, como o nosso, uma transição de nossa economia para o setor de serviços, ou apenas um impacto que,a longo prazo, que precisa ser analisado? – Perguntas dizem mais do que respostas, como assevera a Globonews? – Ei, Guto Abranches (apresentador do programa Conta-Corrente), que tal trabalhar com a Denise Barbosa (ex-Bloomberg), ela no estúdio da BM&F Bovespa e você, no Jardim Botânico? – Difícil?
Pergunta mais fácil: - Afinal, o crescimento do PIB brasileiro, de apenas 2,7% da meta de 4,5% deve ser considerado como um bom resultado, em vista dos 7,5% de 2010? – O carro brasileiro é melhor que o sapato chinês? – Bem, para a CNN, o efeito da crise na Europa (lá, não se fala em crise nos EUA) e a queda da demanda chinesa respondem pela menor expansão do nosso GDP (Gross Domestic Product). Nenhuma palavra sobre a competência da indústria local, nem sobre o peso de nossos impostos. Eles têm mais o que fazer, não vão ficar discutindo ninharias.
Sempre que assisto à CNN, sofro um choque cultural: mudo de canal no intervalo das notícias, no meio de um anúncio de diamantes azuis, e caio no programa político obrigatório do PRB. Mudo de novo, e lá está o Nelson Rubens, do TV Fama, anunciando pomada contra a micose. Outra vez, e caio no Jornal da Record. Ok, pode ser que a Ana Paula Padrão, entre um editorial sobre o MMA e uma reportagem sobre as futuras Olimpíadas de Londres, fale do Código Florestal.
Mais um belo texto...Valeu !
ResponderExcluirApresentei seu blog para a Lúcia, ganhaste mais uma fã...
Victor Esteves