Carnaval x Quaresma, de Pietr Bruegel
Tem tanta coisa acontecendo, que a crise internacional e os sinais de fumaça que o ministro Mantega mandou para a Geral, lá do Planalto, vão se dissipando mais depressa que o enxofre e o CO2 que poluem o nosso ar. Querem ver? – O Pedro acordou. Bom para a família, ótimo para os jovens cantores sertanejos que agradecem às orações de milhares de fãs, todos os dias, pelos telejornais, mas para mim, que nem conheço o rapaz, o que mais significa? Segunda notícia: a rainha da Inglaterra visitou a feira de flores do Chelsea, em Londres, aquele bairro cujo time de futebol acaba de vencer a Liga dos Campeões da Europa. – Ok, mas quem vai comprar todas aquelas flores? – A Grécia?
Carlinhos Cachoeira não falou na CPI, outra informação do dia.
Honrou o nosso acordo secreto de manter o meu post aí abaixo, “Fale com ela”, atual.
Crônica que eu, erroneamente, havia datado. Ele não disse nada, mas a Xuxa foi
convidada para depor numa outra CPI, depois de revelar, no último domingo, em
cadeia nacional, ter sofrido abuso sexual na infância. Livrou-nos, com a sua
coragem, de um grande mal: achar que havia alguma coisa errada no fato de ela
não gostar tanto assim de companhia masculina, exceto a dos campeões nacionais,
Ayrton Sena e Pelé. Não consultei a minha terapeuta para saber se esse reconhecimento
me obriga a ver o programa da moça, nas tardes de sábado.
Os 100 anos que Nelson Rodrigues faria, em agosto,
ensejaram, com o perdão da palavra, uma boa crônica do chato do Arnaldo Jabor,
um de seus melhores discípulos (OESP, 22/5/2012). Mais: a filha do Datena posou
para uma grife de maiôs e o Paulo Coelho deixou-se fotografar ao lado da modelo
tcheca Karolina Kurkova, em Cannes. Karolina, quando jovem, teve problemas com
a própria altura, como Clint Eastwood, que resolvia o bulling da infância e da
pré-adolescência (era magro e desengonçado) na base porrada. “As coisas eram mais simples”, disse à revista
Piauí deste singelo mês de maio. “Vivemos uma geração meio mariquinhas”.
Clint é um bom cineasta, como Jabor, mas não conseguiu emplacar o seu filme recente, J.Edgar (Hoover), com Leonardo di Caprio. Um produto que o crítico, Luiz Carlos Merten, do Estadão, gostou (“adoro quando diretores machos abordam o universo gay – batem duro, mas há neles uma compaixão pelo sofrimento que os diretores gays, como o Visconti, não conseguem ter, sem cair na autocomiseração”), mas considerou depressivo. “O homem que reformou o FBI, perseguiu obsessivamente o comunismo e chantageou poderosos, era apaixonado pela mãe e, sem sair do armário, destruiu todos a quem amou”. Mais: adorava fofocar e bajular as estrelas, segundo Don de Lillo, em “Submundo”, livro que pode ter inspirado Eastwood.
Por falar em submundo, eu, que vejo o Datena, na
Bandeirantes, no fim do dia, para renovar minha fé na Justiça, o vi recusar, no
outro dia, uma reportagem que a Produção preparou com carinho, por considerá-la
de muito baixo nível: “Homem decepa a orelha da mulher durante uma briga”,
anunciou, constrangido, tendo desabafado, em seguida: “Eu me recuso a dar essa
matéria”. Raramente se vê essa coragem, no jornalismo. Provavelmente, o Johnny
Saad não assiste ao Datena. Está vendo, Edir Macedo, do que você se livrou?
Mas, voltando às celebridades e às definições de direita e esquerda, das quais tratou o Jabor, em seu artigo de hoje. No ressentimento do cineasta com a malhação de seus antigos parceiros ao filme Toda nudez será castigada (1973), parceiros estes que passaram a elogiar a obra, depois que a ditadura militar a proibiu, cabe um reparo: não é verdade que toda a esquerda da época tenha odiado Nelson Rodrigues, para incensá-lo só depois de sua consagração como artista.
Ainda garoto, tive o privilégio de trabalhar a duas mesas de onde o Nelson costurava suas crônicas, na redação de O Globo. De fato, nunca lhe dirigi uma palavra. Mas tive a decência de me reconciliar com ele e de reconhecer o seu gênio imediatamente depois de começar a ler suas obras, que, até então me haviam sonegado. Quem me conhece de perto sabe a fórmula antipreconceito que usei, ao educar os filhos, mais tarde: “Eu podia ter aprendido muito com o Nelson, mas nunca me atrevi a tentar, por causa de um preconceito idiota”.
Como as bruxas existem, recebi, justamente hoje, uma dessas bobagens da Internet, classificando comportamentos de direita e de esquerda, o que serviu para reviver discussões saudavelmente idiotas de um grupo de amigos, de diferentes culturas, que se reúne de vez em quando, como um filme de Monicelli. Havia, claro, no material, clichês republicanos e esquerdistas, pequenas crueldades e até algum humor , mas o pior é que ele chegou a suscitar uma discussão séria sobre o que é progressismo e conservadorismo, hoje: de um lado, o humanismo carola dos herdeiros de Kant, disfarçado de consciência ambiental, de outro, a ética do indivíduo, baseada no saudável niilismo nietzcheano. Parecia uma preliminar do Cigano contra o Frank Mir. A essa altura, alguém teve o bom senso de propor que a conversa continuasse num bar.
Enquanto isso, resolvi mandar, ao grupo, os seguintes
trechos de um artigo do Tomzé com a melhor definição de direita e esquerda que li ou ouvi, recentemente:
“Em Irará aprendia-se também a tabuada. A tabuada era mais
misteriosa do que aqueles navios que não tínhamos onde atracar, mais enigmática
do que os infiéis que precisávamos expulsar. Era uma experiência dolorida. Oito
vezes sete, 56. Eu me perguntava: "Quem pode, de sã consciência, provar
que oito vezes sete é 56?" Oito vezes cinco, 40, oito vezes seis, 48. Um
dia, me perguntei, com medo da resposta, quanto era dez vezes dez. Dizia para
mim mesmo: "Ai, minha Nossa Senhora, aí vai ser um inferno completo".
Quando a professora respondeu "cem", tive um grande prazer. Pensei:
Deus está bem intencionado com a humanidade, Deus está olhando pelos seus
filhos, pelas suas criaturas.Para mim, a grande criatura era o alfabeto. A mãe até ensinava, desavisada, antes que entrássemos na escola, que "b" e "a" davam "ba", "b" e "e", "bé", "b" e "i", "bi". Mas, e para entender o que era isso? Quando janeiro chegou, e comecei na escola, com meus oito anos recentes, a professora mandou ler em silêncio, e eu nunca pensei que aqueles sinais podiam transmitir coisas tão exatas como aquele texto. O texto dizia que um aluno, colega nosso, tava com um problema em casa, e então pedia licença à professora para ir para casa. Nossa Senhora, era um verdadeiro assombro! Olhei para o lado, sem acreditar que todo mundo estava vendo o aluno pedir à professora para ir pra casa, se levantar, fazer esse gesto que movimenta milhões de músculos. Eu desconfiava que aquilo, aqueles sinais, não eram capazes de transmitir a todo mundo igual ao que eu estava entendendo”.
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