A situação do povo das favelas, especialmente o da
comunidade Sonia Ribeiro, no Campo Belo, SP/SP, que pegou fogo no dia da
Independência (7/9), não permite piada. Portanto, a decisão do prefeito Fernando
Haddad, de São Paulo, de autorizar a reconstrução dos barracos destruídos pelo
fogo, “desde que respeitadas as normas”, não pode ser brincadeira. Tenho poucos amigos engenheiros (talvez o
Gustavo Campos, meu sobrinho), mas vou buscar ajuda para tentar identificar os meios disponíveis para tentar viabilizar a decisão do prefeito.
Normas – eu tive uma tia com esse nome, já falecida – caso
ele esteja se referindo a pessoas, já não se encontram assim, facilmente: conheço
Suelens, Tatianas, Verolanges, Edivânias e Suelis, mas Norma, nenhuma. Não deve
ser isso. O prefeito deve ter se referido a regras, condições específicas, sem
as quais, ele não vai permitir a reocupação da favela.
Devem estar previstos, portanto: projeto e execução de
saneamento básico; eliminação de “gatos” de energia elétrica; medidores de água
monitorados pela Sabesp por meio de “smart grid”; materiais de construção leves
e inflamáveis, como kevlar e nomex; isolamento termoacústico (para evitar potenciais
desentendimentos entre vizinhos) e Brigada de Incêndio, com reuniões semanais
entre técnicos da prefeitura e bombeiros voluntários.
“Vista como uma exceção pela gestão”, diz a Folha de S.Paulo
de 12/9, “a reconstrução dos barracos passou a ser cogitada diante da
resistência de muitos desabrigados a aderir ao programa social da Prefeitura”
(auxílio aluguel de R$ 1,2 mil, a cada três meses). "Nosso acordo é que, se
houver reassentamento no local, em função de que o bolsa-aluguel não resolve o problema,
será feito mediante orientação dos engenheiros da Secretaria de Habitação”,
declarou o prefeito. "Para impedir riscos".
Os moradores da favela estão divididos entre aceitar o
bolsa-aluguel ou reconstruir os barracos. "Eles só querem que a gente saia
para cercar o terreno. Aí vai chegar o engenheiro e dizer que não é apropriado
para a gente morar", afirma o auxiliar de servente Robson Dalmo, 37.
"Por isso, o pessoal quer construir de novo os barracos", afirma.
"O prefeito veio aqui, tomou café e foi embora. Se
fosse bom mesmo, dava bloco para todo mundo reconstruir", diz a diarista
Neusa Joaquina de Santana, 40. Entre os moradores que pretendem optar pelo
auxílio-aluguel, há o medo de perder mais um barraco. "Depois, eu gasto três mil em material e eles mandam derrubar", afirma o vigilante José Alcides
da Gama, 55, que está na casa de parentes.
Ao reconstruir os barracos da comunidade Sonia Ribeiro, talvez
o prefeito possa aconselhar-se com a presidente do país vizinho, Cristina
Kirchner que, há poucos dias, anunciou a construção do prédio mais alto da
América Latina, na confluência dos rios da Prata e o Riachuelo (considerada a
via fluvial mais poluída do país). O prédio terá 67 andares e “a magnitude do Central
Park, de Nova York”. Segundo Cristina, será "um símbolo de Buenos Aires". A
decisão, de acordo com a presidente, foi tomada com base numa experiência esotérica
durante a qual ela descobriu ter sido, em outra encarnação, um arquiteto
egípcio (talvez o construtor da pirâmide de Keóps).
Eu também gostaria de ouvir o nosso colega, Washington
Novaes, a respeito da ideia do Fernando Haddad. Além da competência
profissional e das reconhecidas consciência e militância ambientais, o
Washington navega, há anos, nos problemas da ocupação desordenada das
cidades. Em artigo publicado no Estadão
da última sexta-feira (12/9), ele mostrou-se perplexo diante da completa
ignorância, pelos candidatos à presidência, governos estaduais e parlamento, de
questões verdadeiramente importantes para os habitantes das grandes cidades.
Washington lembrou que o déficit habitacional de 6 milhões
de moradias no país foi mencionado nos programas dos candidatos à presidência enviados ao TSE, mas os problemas urbanos – como a mobilidade, que
gerou os protestos de junho – foram apenas contornados. Não há, por exemplo, nas
plataformas de campanha, nenhuma referência à expansão desordenada de
megalópoles como Rio e São Paulo, que já tem, hoje, 85% de suas respectivas
áreas totalmente ocupadas.
“Em 1960, tínhamos apenas 45% de urbanoides e 55% das
pessoas no campo. Sem políticas adequadas”, alerta o jornalista, “chegamos onde
estamos e caminhamos para uma concentração ainda maior - embora possa haver
políticas adequadas, como a adotada em Portland, nos Estados Unidos, que
conteve o seu crescimento horizontal, ou Guelph, no Canadá, que refreou a sua
expansão vertical. Somos a quarta maior população urbana do mundo e não levamos
em conta prioridades capazes de estimular ou inibir esse crescimento”.
“O que se deve pensar”, pergunta Novaes, “quando o próprio
Conselho Municipal do Patrimônio Histórico está deixando de lado regras que
dificultavam a construção de prédios e reformas vizinhas a bens
tombados em São Paulo? Segundo as notícias, oito regiões da capital paulista
que estavam congeladas por uma lei de 1992 já podem receber empreendimentos sem
autorização prévia, inclusive a Praça da República e os corredores do Colégio
Sion, em Higienópolis”.
"Não bastasse a explosão populacional, a preferência, em nossas cidades, é por apartamentos: 210 mil pessoas saíram de casas em São Paulo para edifícios residenciais, em cinco anos, e já são 37% do total de habitantes, que alegam como razão principal para isso a "segurança". Mas onde está a discussão entre segurança e formatos de viver? E onde foi parar o debate sobre a qualidade de vida, em cidades como São Paulo, onde são despejadas, a cada ano, 71,6 milhões de toneladas anuais de dióxido de carbono - dez vezes mais que há uma década?"
O tema da corrupção, por sua vez, levantado pelo William Waak no Globonews
Painel do último sábado (13/9), parece não sensibilizar mais ninguém. Segundo
o cientista político e filósofo Fernando Schuller, da UFRGS, mais de 70% dos
brasileiros consideraria normal obter vantagens em pequenos ilícitos, como
aceitar propina ou empregar um parente num cargo público, caso tivesse essa
chance.
Os candidatos à presidência - que
incluem um ex-governador e uma presidente “gerentona” - preferem duelar sobre falsos dilemas morais e indicadores
macroeconômicos, deixando de lado a qualidade de vida dos cidadãos. Nesses momentos, aliás, todos prometem cuidar da
Educação e da Saúde – as duas chagas mais sensíveis da sociedade brasileira –
mas não explicam com que recursos farão
isso, e nem porque não o fizeram até hoje.
A grande discussão da campanha política – além do mal estar
entre as duas principais candidatas em torno dos propinodutos de uma e das
idiossincrasias de outra – está em quem é mais parecido com o Levy Fidelix, do
Aerotrem: o Mr. Spacely Jetson, do desenho futurista, ou professor Dingle Dong,
do malévolo Picapau, de Walter Lantz. Nessa linha, sempre achei o Paulo Skaf muito
parecido com o Golias, o comediante – com a ressalva de que o Golias acreditava
no que estava fazendo – e não me surpreenderia se o Paulo Roberto Costa saísse
de Darth Vader no próximo desfile da Mangueira: “Together, we can rull the
galaxy”.
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